Atualizada em 29 de novembro às 10h28. 1h2i2a
Em ataque ao movimento camponês, mais de 120 agentes da Polícia Civil invadiram casas, prenderam e realizaram operações de busca e apreensão contra diversos camponeses e apoiadores da luta pela terra, entre eles uma advogada popular, Lenir Correia Coelho, da Associação Brasileira dos Advogados do Povo (Abrapo). As violações ocorreram no dia 23 de novembro, como parte da Operação “Canaã” fase 3, pelos agentes da 2ª Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco) comandada pelo fascista governador Marcos Rocha, seu Secretário de Segurança Pública, José Hélio Cysneiros Pachá (apelidado pelos camponeses como “carniceiro de Santa Elina”) e pelo governo militar de Bolsonaro e generais.
Essas ações fazem parte de uma série de operações policiais desencadeadas principalmente na região amazônica, no Norte do país, que visam preparar uma guerra de grandes dimensões contra os camponeses que radicalmente lutam pelo direito à terra. Essa é a terceira fase da Operação “Canaã” iniciada ainda este ano, há menos de 6 meses e que já teve como pretexto em suas fases anteriores o combate a “crimes ambientais”.
O processo jurídico que embasou a ação dos policiais definiu o movimento camponês Liga dos Camponeses Pobres (L) como uma organização criminosa. A atitude reacionária e antipovo de criminalização da luta de camponeses pelo legítimo direito à terra consiste, agora, na negação aberta ao direito à defesa jurídica aos trabalhadores, direito previsto até mesmo na constituição que o velho Estado diz defender e se pautar. Com isso, os latifundiários e seu governo buscam isolar o movimento camponês para facilitar a realização de massacres aterrorizando apoiadores. Nessa operação, até mesmo a casa da reconhecida advogada que atuou ao lado dos camponeses em recentes conflitos foi invadida e apreendidos seus pertences individuais.
O juiz Fábio Batista da Silva, da vara de São Francisco do Guaporé, foi quem assinou a ordem para a operação que visava a prisão de seis pessoas e a invasão de casas de mais 18, entre eles trabalhadores residentes em Áreas camponesas e advogados. A operação tinha a previsão de ocorrer nos municípios de Ji-Paraná, Presidente Médici, Seringueiras e São Miguel do Guaporé.
Foram alvos desta perseguição por meio da ordem de prisão Rubens Ferreira Braga, Claudecir Ribeiro Silveira, Evaldino Gonçalvez, Angélica Neves de Jesus, Débora Ferreira da Silva e Wemerson Marcos da Silva. Quanto aos demais que tiveram apenas concedido o pedido de busca e apreensão foram, além da advogada Lenir, também Erley Ti Campista, Vanderson Prudente Ribeiro, Geraldo Fidelis Rocha, José Carlos Ladislau, Benito Alves da Cruz, Leandro Betonte, Mirival Pereira, Henrique Schulz, Deivid Paulino Marciano, José Erisvaldo Tenório de Goes, Poliana Fideles, Claudemir Duarte Shul, Lucilene Freitas da Mota, Marileuza Francisca de Jesus, Evandro Fransico de Jesus, Janaine Menegildo Zanella e “Marcos”, sem referência ao sobrenome.
Casa de advogada popular é invadida
Diversas entidades apontam com destacada ênfase para o fato de ter sido violado um importante direito democrático, previsto até mesmo na constituição vigente do velho Estado: o direito dos advogados defensores do povo de exercerem livremente sua profissão e o direito dos camponeses de terem livre o a essa defesa.
Esse direito foi autoritária e arbitrariamente violado através da perseguição e do mandado de busca e apreensão contra a advogada popular Lenir Correia, que teve sua residência invadida pela polícia. Lenir é membro da Associação Brasileira de Advogados do Povo Gabriel Pimenta (Abrapo) e da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap). Ela é marcada pela sua firme defesa dos camponeses em diversos processos de despejo há muitos anos, tendo sofrido já diversas ameaças e, agora, nova perseguição do aparato judicial-policial. Ao arrepio da lei (que prevê inviolabilidade da relação entre advogado e cliente), as tropas levaram todos os materiais de trabalho da advogada como agendas, telefone celular e notebook, onde estavam dados íntimos e sigilosos de todos os clientes e ainda buscando impedi-la de prosseguir seus trabalhos.
Em uma coletiva de imprensa posterior às arbitrariedades cometidas, os policiais afirmavam ter encontrado dinheiro na casa da advogada, porém sequer sabiam dizer qual a quantidade. No dia 17/11, em meio a outra operação infundada promovida pela PM-RO no Acampamento Escurão, localizado na Gleba Corumbiara, ação que resultou na prisão de cerca de 30 trabalhadores, a advogada foi abordada e, de maneira ilegal, foi indagada sobre as reuniões com seus clientes que ocorreriam no local.
A advogada popular Lenir Correia foi definida pela Abrapo como “dedicada advogada na defesa do direito dos camponeses”. Ela atua na defesa jurídica de diversos camponeses que têm sofrido graves violações aos direitos básicos do povo.
Ela é uma das advogadas que atua em defesa dos moradores das Áreas Tiago Capim dos Santos e Ademar Ferreira, locais que recentemente sofreram ataques através de operações policiais com aparatos bélicos e métodos próprios de guerras civis, onde foram cometidos assassinatos, invasões arbitrárias e cercos ilegais. Lenir integra um grupo de trabalho que reúne dezenas de advogados e juristas no apoio jurídico às centenas de famílias que são perseguidas politicamente pela “justiça” do velho Estado.
A Abrapo denuncia que esta arbitrária e ilegal ação da polícia trata-se de graves violações às prerrogativas do advogado e de evidente retaliação do latifúndio contra a defesa dos camponeses exercida pela advogada. As invasões ocorrem em período que o latifúndio sofreu uma derrota política, com a decisão do STF que determinou o fim da operação de despejo, decisão arrancada pela luta firme dos camponeses aproveitando-se da divisão no seio das classes dominantes no seu aparelho de Estado.
A entidade declara que tal perseguição à advogada se trata de “uma clara violação dos direitos dos defensores do povo e do povo, que sofre a negação do seu direito de defesa ao ver seus advogados serem tratados como criminosos por trabalhar na defesa dos camponeses”.
A área sob mira da investigação é comprovadamente grilada pelo latifúndio
O inquérito policial que busca criminalizar o movimento camponês e que deu origem às ordens de prisão e aos mandados de busca e apreensão têm como base as tomadas de terra ocorridas em São Francisco do Guaporé e Seringueiras, municípios de Rondônia, no ano de 2016. Ali se encontra o Acampamento Enílson Ribeiro, localizado sobre terras da União que foram comprovadamente griladas pelo latifundiário Augusto Nascimento Tulha, médico reformado do Exército reacionário brasileiro.
Antes da tomada das terras pelos camponeses o próprio Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), através do ouvidor Agrário de Rondônia, Erasmo Tenório da Silva, já havia definindo-as como griladas.
No Acampamento ocorreram outros ataques e cercos, tão beligerantes e ilegais quanto os recentemente vistos do norte ao sul de Rondônia e assim como nos desdobramentos dos fatos recentes, foi palco de episódios em que as famílias impam uma grandiosa resistência e retornaram à área em 2018.
Na época, a L denunciou: “Vivemos uma verdadeira escalada fascista no país. Toda essa situação comprova que ao contrário do discurso de ‘Estado democrático de direito’, vivemos num verdadeiro Estado policial que como instrumento das classes exploradoras, destacadamente o latifúndio, classe mais atrasada e que infelicita nosso povo, atua com todos os seus recursos para atacar os mais elementares direitos democráticos e exercer a mais brutal repressão sobre o povo”.
Sobre os mesmos fatos, o movimento camponês declarou ainda: “Todos eles temem e tentam impedir que os camponeses se levantem em grandes ondas tomando e conquistando todas as terras do latifúndio. Mas nada impedirá o avanço da Revolução Agrária, que mais cedo que tarde se alastrará por todo o campo brasileiro.”.
Policiais civis invadiram casas e prenderam diversos camponeses e apoiadores da luta pela terra. Foto: Vip Notícia