Poema: “Sentado sobre os mortos” (1937), de Miguel Hernández 4l362q

Poema: “Sentado sobre os mortos” (1937), de Miguel Hernández 4l362q

Miguel Hernández (1910 – 1942) foi um poeta comunista espanhol que lutou na Guerra Civil de seu país pelo famoso Quinto Regimento. Foi detido na fronteira com Portugal e morreu de tuberculose na prisão. Poema traduzido do livro Viento del Pueblo (1937). 4o124q

 

Sentado sobre os mortos

Que se calaram em dois meses,

Beijo sapatos vazios

e empunho furiosamente

a mão do coração

e a alma que o mantém.

 

Que minha voz suba aos montes

e caia à terra e troveje,

isso pede minha garganta

desde agora e desde sempre.

 

Aproxima-te de meu clamor,

povo do meu próprio leite,

árvore que com suas raízes

encarcerado me manténs,

que aqui estou eu para amar-te

e estou para defender-te

com o sangue e com a boca

como dois fuzis fiéis.

 

Se eu saí da terra,

se eu nasci de um ventre

miserável e empobrecido,

não foi senão para me fazer

rouxinol dos miseráveis,

eco da má sorte

e cantar e repetir

a quem escutar-me deve

quando às penas, quando aos pobres,

quando à terra diz respeito.

 

Ontem amanheceu o povo

desnudo e sem o que vestir,

faminto e sem o que comer,

o dia de hoje amanhece

justamente revolto

e sangrento justamente.

Em sua mãos os fuzis

leões querem tornar-se

para acabar com as bestas

que tantas vezes já o empunharam.

 

Ainda que faltem as armas,

povo de cem mil poderes,

não desfaleça teus ossos,

castigue a quem te maltrata

enquanto te restarem punhos,

unhas, saliva e te restarem

coração, entranhas, tripas,

coisas viris e dentes.

Bravo como o vento bravo,

leve como o ar leve

assassina ao que assassina,

abomina o que abomina

a paz de teu coração

e o ventre de tuas mulheres.

Que não te firam pelas costas,

vive cara a cara e morre

com o peito frente às balas,

largo como as paredes.

 

Canto com a voz de luto,

povo meu, por teus heróis:

tuas ânsias como as minhas,

tuas desventuras que tem

do mesmo metal o pranto,

as penas da mesma têmpera

e da mesma madeira

teu pensamento e minha testa,

teu coração e meu sangue,

tua dor e meus louros.

Antemuro do nada

esta vida me parece.

 

Aqui estou para viver

Enquanto a alma ressoar,

e aqui estou para morrer,

quando a hora chegar,

nas nascentes do povo

desde agora e desde sempre.

Vários tragos é a vida

e um só trago é a morte.

 

 

Miguel Hernández discursando às tropas republicanas na Guerra Civil Espanhola, em 1937. Foto: David Seymour.

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