Deputados bolsonaristas querem tramitar no Congresso um projeto de lei que limita o uso de imagens de câmeras corporais de policiais como prova de crimes que venham a ser cometidos pelos PMs contra o povo. A proposta é do deputado Capitão Augusto (PL), que fez sua carreira na Polícia Militar de São Paulo. O texto foi apresentado na mesma semana em que notícias mostraram evidências de que policiais manipularam as câmeras para disfarçar crimes, sobretudo de execuções. 6l611d
O principal argumento do texto, de co-autoria do também PM Coronel Ulysses (União-PI), se concentra na suposição de que o uso da câmera para obter provas de possíveis crimes cometidos pelas polícias seria uma forma de “auto acusação”, o que supostamente iria contra o direito constitucional que permite ao cidadão de não se incriminar.

Contudo, a câmera, além de fazer parte do conjunto de equipamentos necessários para o trabalho das PMs na Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, é do Estado – e não do policial – sendo parte do uniforme. Logo, não se trata de um registro pessoal usado contra a própria pessoa. Os próprios policiais são funcionários públicos, estando sujeitos a todo tipo de fiscalização.
A noção de que o uso da câmera poderia promover uma suposta “auto acusação” ignora também o principal motivo para a exigência do uso do objeto: a crescente na mortalidade por violência policial, que somente em 2024 foi responsável pelo assassinato de ao menos 6.121 pessoas, cerca de 17 por dia, de acordo com dados do Sistema Nacional de Informação de Segurança Pública (SNISP) e do Ministério de Justiça e Segurança Pública (MJSP).

Em dezembro de 2024, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, determinou a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais para a PM de São Paulo. A medida foi motivada pela alta na mortalidade policial no estado, que somente em 2024 deixou um rastro de 814 assassinatos, segundo os dados do SNISP e MJSP.
Enquanto a dupla de PMs apresentava a proposta para o Comissão de Segurança Pública da Câmara, imagens macabras obtidas de câmeras corporais que mostram o momento execução de Gabriel Fernandes, jovem trabalhador de 19 anos, na Vila Silvia, Zona Leste de São Paulo, circulavam nas redes, causando espanto e indignação por parte dos internautas.
A versão oficial da polícia sobre o caso apresentava uma série de distorções frente às imagens demonstradas, sugerindo que Gabriel teria fugido armado em uma moto sem placa. Contudo, as câmeras mostram o homem caído no chão após ser baleado pelo sargento Ivo Florentino dos Santos. Após ferido, os policiais exigiram que colocasse as mãos para o alto, ouvindo um “cala boca” quando pediu calma.
Gabriel estava desarmado, conforme constam as imagens, e implorou por sua vida: “Não sou bandido, não, senhor.”, disse ele.“Eu sou trabalhador senhor, para quê fazer isso comigo, meu Deus? Me ajuda, senhor, por favor!”
Em seguida, os policiais desviam a câmera e um PM denominado de Ailton se agacha, demonstrando para seu colega como colocar a arma no chão sem ser identificado. O sargento Ivo chegou a pedir para um dos policiais com câmera se virar. Uma imagem registrada por Ailton chega a filmar o sargento chutando uma arma, atribuída à vítima.

Outro caso, divulgado nesta segunda-feira (26/05), mostram Emerson Rogério Telascrea, de 33 anos, sendo assassinado por um policial durante a Operação Verão de 2024, que deixou 56 mortes, a maior chacina da PM de São Paulo desde o Massacre do Carandiru, de 1992, responsável por ass a sangue frio 111 detentos.
O vídeo mostra que Emerson não recebeu os PMs a tiros, como constava no registro policial, e em nenhum momento há sinal da pistola calibre .765 que os policiais disseram que o homem estava portando.
A filmagem mostra que Emerson foi alvejado e em seguida, cercado pelos policiais, que correram para o local tampando as câmeras. Após cerca de 30 segundos, Emerson foi alvejado por mais dois tiros. Somente depois do terceiro tiro que as câmeras são destampadas.
Enquanto se aproximam, é possível ouvir na gravação Emerson falando “Desculpa, senhor”, sendo assassinato antes de terminar a frase.
Os policiais chegaram a agachar, simulando o recolhimento de uma arma que não aparece. Em um outro momento, um soldado chega a colocar uma luva cirúrgica, previamente levada, para mexer no corpo para encontrar a suposta arma. Indicações apontam que poderia estar dificultando o o às informações que poderiam sugerir uma ação criminosa.
