Nome importante no cenário da música instrumental, o paraense Sebastião Tapajós é um brasileiro conhecido no mundo, e referência para muita gente. Radicado em Belém, o veterano violonista e compositor nunca abandonou sua cultura, e está envolvido com os movimentos de música do seu lugar. 5u1529
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— Sou do Baixo Amazonas, de Alenquer, oeste do Pará, uma várzea que é um braço de Rio, onde desemboca o Surubiú, esse rio grande que vem desde Roraima etc. Nasci praticamente dentro de um barco, porque abril é um mês de cheia, e as várzeas ficam todas cobertas pelas águas — conta.
— Comecei a tocar violão, porque meu pai tinha um violãozinho simples lá, que estava todo descolado, e resolvi fazer uns reparos na madeira. Ele vendo aquilo me disse: ‘ah, tu gosta de música né’, e comprou um violão para mim — diz.
— Mudamos para Santarém, que é uma cidade maior um pouco, e ele me colocou na aula de violão do João Fona. E na minha inocência de criança, tinha muita vontade de aprender partituras, porque pensava que assim ficaria independente, não precisaria mais ir para aulas.
Sebastião diz que sempre foi muito curioso, e isso o ajudou a tocar o que ouvia.
— Naquela época não tinha televisão nas casas, era só rádio mesmo, e eu vivia ouvindo e tirando as músicas. Meus amigos falavam ‘onde ele aprendeu isso’? E não acreditavam que foi pela rádio. Fora isso, ouvia muito Dilermando Reis e Garoto, referências para mim — fala.
— Com aproximadamente uns 16 anos surgiu uma oportunidade de caminhar para Belém. Tive apoio de um professor, que me ouviu tocar clássicos, Chopin e essas coisas, e se agradou muito.
— Estudei também com o Othon Salleiro, do Rio de Janeiro, uma capacidade maravilhosa, criativa e de técnica violonística. Além de músico ele era psiquiatra (risos). Fiquei trinta e poucos dias em sua casa, e pude aprender muito — conta.
Em 1964 Sebastião embarcou para a Europa, com uma bolsa de estudos no Conservatório de Lisboa.
— Foi um pessoal de Portugal que me ouviu tocar no teatro da Paz, aqui em Belém, e proporcionou isso. ei o ano todo lá e metade de 65, estudando com figuras importantes no ensinamento do violão clássico na época — diz.
— Depois ganhei outra bolsa para estudar no Conservatório de Madri, na Espanha. E fiquei nesse pingue pongue, fazendo uns concertos, sobrevivendo já de música, e tinha vinte anos de idade — continua.
— De volta para Belém, me deram uma cadeira de música no Conservatório Carlos Gomes. E surgiram outras viagens e promessas de Shows — acrescenta Sebastião, que se mudou para o Rio de Janeiro em 1967, e conheceu Billy Blanco e Baden Powell.
Amizades, parcerias e música 4l3224
— Certa vez o Billy me disse: ‘hoje à noite o Baden Powell vai estar lá com o pessoal, numa reunião. Tem um detalhe Tião, ele vai estar com o violão na mão, não larga, ele é viciado (risos), toca o tempo todo. Mas vai ter um momento que vai cansar, então vou pedir pra você tocar’.
— E continuou: ‘Se ele não gostar de te ouvir, vai dizer que vai ao banheiro e não volta mais’. Eu disse: ‘Está legal Billy’. E assim foi. Chegamos as 22 horas, o Baden estava tocando. Quando foi umas 2 horas da madrugada ele parou de tocar, deixou o vilão — recorda com alegria.
— Então o Billy disse: ‘Olha, tem uma amigo aqui que chegou lá da minha terra, queria que você ouvisse’. ‘Toca Tião’. Toquei a primeira, quando terminei ele ajeitou os óculos, e disse: ‘Toca mais uma’. Toquei a segunda, a terceira. Ele levantou e disse: ‘Puxa, até que enfim eu gosto de um cara que toca violão’ .
Muita gente ficou sabendo dessa história, que serviu de impulso para sua carreira.
— O Baden era a maior sumidade na música, e foi um ícone do violão brasileiro para o mundo. Acabei ficando seu amigo. Outras histórias desse tipo fazem parte da minha vida, com todo esse pessoal que conheci, fiquei amigo — comenta.
Entre as suas muitas parcerias estão: Sivuca, Altamiro Carrilho, Waldir Azevedo, Gilson Peranzzetta, Hermeto Pascoal, Arismar do Espírito Santo e Mauricio Einhorn.
— Foram muitas viagens pelo país, Europa. Só para a Alemanha fui umas 90 vezes. Morei muitos anos no Rio de Janeiro, vivi em Curitiba, ficava nesse pingue pongue. Mas nunca deixei de verdade a minha região — expõe.
— Penso que todos nós temos as nossas raízes, e o homem tem que viver principalmente apoiado nelas. Nunca larguei essas influências que tive na infância, os carimbós. O Naná Vasconcelos é a mesma coisa, não larga o maracatu dele lá — diz.
Entre outros, Sebastião Vasconcelos tem uma série de discos amazônidas. Recentemente fez um CD de guitarrada, gênero paraense que nasceu da mistura de carimbó, cúmbia, choro e jovem guarda.
— Ficou um trabalho regional nortista. ‘Aos da Guitarrada’ é uma homenagem aos mestres da guitarrada, e um amigo meu lá de São Paulo, o Marco Bosco, ouviu e me disse: ‘Oh Tião, com esse CD até poste dança’ — brinca.
Sebastião tem feito trabalhos com jovens violonistas e pianistas.
— Vou ando meu saber para a garotada, porque ninguém leva nada dessa vida. É uma sabatina, um negócio que vai funcionando, tanto que faço na base do ‘vem aqui em casa que vamos começar um trabalho, não está nada pronto’ — relata.
— Devo gravar um disco com um pianista chamado Anderson, lá de Santarém, e gravei um aqui em Belém com Igor Capela, violonista e guitarrista — conta.
— Gravei há pouco também um disco com o argentino Sergio Abalos, com uma das Quatro Estações, do Piazzolla, e músicas minhas e dele. Inclusive, no ‘Aos da Guitarrada’ tenho uma música dedicada a ele, chamada Milongueiro Abalos — continua.
No momento Sebastião está preparando um novo trabalho, que deverá ser de coletâneas.
— Provavelmente serão três coletâneas, duas com parceiros de várias partes do país e uma de violão solo. Esse trabalho será muito bonito, muita coisa já está feita. Fora isso, estou envolvido com os movimentos de música daqui — fala.
— Por exemplo, me dou com o pessoal do choro de Belém. De vez em quando fazemos algumas coisas juntos. Já compus muitos choro também — continua.
— Tenho uns 70 discos gravados, entre bolachão e CDs, e alguns prêmios, sendo que destaco o Grande Prêmio do Disco do Ano, na Alemanha, em 1982. E a vida segue — conclui Sebastião Tapajós.
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