A sonda Chang’e 6, desenvolvida pelo social-imperialismo chinês, pousou na face oculta da Lua no dia 1° de junho de 2024, tornando a China o único país a explorar essa região do satélite natural da Terra. O pouso se deu na mais antiga e profunda depressão da Lua, a Bacia Aitken, e foi justificado pelo objetivo de recolher amostras de poeira e rochas lunares dessa área pouco explorada. Um outro motivo, não revelado oficialmente, é acelerar na disputa interimperialista com o Estados Unidos, em uma nova etapa do processo já chamado de “nova corrida espacial”. 3q1b69
O chamado “lado oculto” ou “lado escuro” da Lua é o hemisfério que não pode ser visto da Terra devido a um fenômeno denominado rotação sincronizada. O tempo que a Lua gasta para dar uma volta completa ao redor da Terra (revolução) é igual ao tempo que ela gasta para dar uma volta em torno de si mesma (rotação). Ambos duram 28 dias, e por conta disso a Lua sempre nos mostra o mesmo lado.
Para realizar a coleta do solo, primeiro uma furadeira penetrou na superfície lunar até o subsolo do satélite natural. Depois, um braço robótico coletou o material. A missão durou 53 dias, e no dia 25 de junho a sonda chinesa voltou ao país asiático com as amostras coletadas. O anúncio foi feito frente às câmeras de diferentes órgãos de imprensa, para ostentar o avanço do social-imperialismo chinês na pugna com o EUA.
A China já planeja os próximos os. A missão Chang’e 6 servirá de treinamento para futura missão do Programa Espacial Chinês que coletará amostras do solo de Marte para investigar a origem da vida e condições de habitação no planeta vermelho.
O socialismo e o espaço 1d6y2c
Contudo, nem sempre o programa espacial chinês foi palco da disputa interimperialista entre a China e o EUA. Nos tempos do socialismo, o desenvolvimento dos foguetes eram feitos à serviço do povo e da soberania nacional da República Popular, e foram uma demonstração da força e da independência da Nova China.
O governo da República Popular da China (RPC) criou o Instituto de Mecânica Aplicada em Pequim, da Academia de Ciências da China (ACC), em 1956, menos de 10 anos depois do triunfo da Revolução. O instituto tinha como objetivo principal pesquisar mecânica aplicada e aerodinâmica de alta velocidade para defender o país. Tudo foi orientado pelo Partido Comunista da China e pelo Presidente Mao Tsetung, que reconhecia o importante papel que os mísseis teriam para a segurança nacional e proteção contra as agressões imperialistas.
Ao mesmo tempo que esses primeiros os eram dados, os comunistas precisavam descobrir como superar o desafio de desenvolver um Programa Espacial do zero. Parte da resposta foi concluída por um acordo com a União Soviética, que havia lançado o satélite Sputnik em 1957. Naquela época, a antiga pátria socialista estava em processo inicial de restauração capitalista.
Acordo e desacordo com a URSS 5b4t2k
O acordo foi proposto por Mao Tsetung no Congresso do Partido Comunista da China de 1958. Ele pontuou a necessidade de desenvolver um satélite como parte dos esforços do Grande Salto Adiante. Ainda em 1958, a China socialista fundou, sob a liderança de Mao, o Centro de Lançamento de Mísseis de Jiuquan e o Instituto de Mecânica e Eletrônica de Xangai, que contou com cientistas e técnicos de vários institutos e universidades do país. Ao mesmo tempo, o número de formados no país, sobretudo em áreas como engenharia, seguia a aumentar por conta da abertura das universidades às massas populares.
Planos claros foram desenhados: era necessário desenvolver foguetes de sondagem, lançar um satélite de 200 kg e lançar um satélite de várias toneladas. Primeiro, a sondagem, já que não seria possível, com os poucos recursos do país, desenvolver todos os projetos simultaneamente. Após dois anos, no mês de fevereiro de 1960, os chineses conseguiram lançar o primeiro foguete de dois estágios, com estimados 190kg, 5,3m de altura e com capacidade de atingir 10km de altitude com a tecnologia de propulsão a combustível líquido e sólido. Em setembro do mesmo ano foi lançado o foguete de sondagem T-7M.
Mas em 1960, a China e a União Soviética romperam as relações, como consequência do aprofundamento da restauração capitalista na URSS. O Presidente Mao abriu uma luta pública com o Partido Comunista da União Soviética para denunciar a guinada ao revisionismo após a morte de Stalin. A troca de cartas ficou conhecida como “O Grande Debate” e, do lado da China, “A Carta Chinesa”.
O programa espacial foi impactado, não abalou os comunistas chineses. O Partido Comunista da China decidiu permanecer no desenvolvimento dos programas espaciais, agora apoiado somente nas próprias forças. No início da década de 1960, três institutos ligados à ACC (Instituto de Geofísica, Instituto de Biofísica e Instituto de Mecânica e Eletrônica de Xangai) já trabalhavam juntos em programas de pesquisa e desenvolvimento nas áreas de medicina espacial, aerodinâmica, mecânica orbital, engenharia de foguetes, desenvolvimento de combustíveis e controle e automação.
Nessa mesma época, a China recebeu de volta um de seus filhos pródigos em engenharia espacial: Qian Xuesen, um engenheiro nascido em Hangzhou que estava estudando no EUA.
‘Não vou fazer armas contra meu povo’ 672y
Autor de pelo menos 13 artigos e duas monografias, Xuesen desenvolveu no EUA projetos como o Laboratório de Propulsão a Jato, do qual foi um dos fundadores, no Instituto de Tecnologia da Califórnia. Ele se formou na Universidade Nacional Tung, em Xangai, em 1934, concluiu o mestrado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, no EUA, em 1936, e o doutorado no Instituto Tecnológico da Califórnia três anos depois. Acabou lecionando na mesma instituição até 1943, antes de ser recrutado pelo Departamento de Defesa e pelo Departamento de Guerra do USA, no qual exerceu várias funções e chegou à patente de Coronel em 1945.
Mesmo assim, em 1950, foi acusado pelo EUA de ter “simpatias comunistas” e perdeu a chamada “credencial de segurança”. Furioso, decidiu voltar à China, mas também não conseguiu: quando estava chegando na Terminal Island, próximo de Los Angeles, foi parado por forças repressivas do EUA e foi preso. Quando abordado, foi questionado pelo Subsecretário da Marinha ianque: “Diabos, não pensava que você fosse um comunista”. E respondeu: “Sou chinês. Não quero construir armas para matar meu povo. É simples assim”.
Xuesen ou cinco anos em prisão domiciliar virtual junto de sua família. A liberdade veio quando a China trocou a soltura de Xuesen pela repatriação de pilotos estadunidenses presos durante a Guerra de agressão do EUA à Coreia, em um processo coordenado de perto por Mao Tsetung e pelo então ministro de Relações Exteriores da China, Chou En-lai. Assim que foi solto, o engenheiro embarcou no SS President Cleveland e voltou para a China.
De volta em casa, Xuesen foi rapidamente incorporado nos programas espaciais. Ele fez parte da equipe de cientistas que coordenou o programa “Duas bombas, um satélite”, que desenvolveu as primeiras bombas nucleares chinesas (1964 e 1967), o primeiro míssil balístico (1966) e o primeiro satélite lançado pelo país ao espaço (1970). Contribuiu também no desenvolvimento da indústria de defesa chinesa e do sistema de educação superior e pesquisa do país.
Muitas conquistas 5u4023
Também em 1964, a China lançou o primeiro míssil totalmente projetado e construído pelos chineses: o Dong Feng 2, (Vento Leste, em português). Esse evento motivou a retomada do projeto de satélites pela RPC. O país decidiu usar a tecnologia de mísseis balísticos, já razoavelmente desenvolvida, para impulsionar o lançamento de satélites.
Em abril de 1965, o Comitê Central do PCCh apresentou a proposta de colocar um satélite de 100 kg em órbita até 1971, o que se tornou o Programa do Satélite Nacional. No dia 24 de abril de 1970 o primeiro satélite chinês, denominado Dong Fang Hong (O Oriente é Vermelho), foi lançado pelo foguete Chang Zheng (Longa Marcha). Até 1976, ano que marcou o fim da Grande Revolução Cultural Proletária (GR) e a chefatura do Presidente Mao na RPC foram lançados um total de 11 satélites.
As atividades dos primeiros anos do Programa Espacial Chinês foram responsáveis pela criação de institutos de pesquisa, muitos dos quais em províncias do interior do país. Além disso, várias fábricas que forneciam insumos para o desenvolvimento de produtos eletrônicos, semicondutores, ópticos, químicos e de engenharia de precisão foram criadas. Escolas técnicas foram construídas a fim de capacitar operários para esse trabalho. No final de 1970 cerca de 250.000 pessoas trabalhavam no programa espacial.
Os rumos do Programa Espacial com a restauração capitalista na China 2e1mk
Com a ascensão de Deng Xiaoping e a restauração capitalista na China após a morte do Presidente Mao, uma das primeiras atitudes relacionadas ao Programa Espacial do país foi a do acordo de cooperação espacial com os ianques em 1979. Esse acordo cobria a importação de produtos fabricados no USA para a construção de satélites de comunicação.
Os revisionistas chineses tinham que dar mostras de que haviam abandonado o caminho revolucionário em todas as esferas da sociedade chinesa, inclusive na área espacial. A reforma realizada por Deng Xiaoping chamada de “o sistema de um terço” abandonou o caminho da independência cultivado no socialismo e abriu o Programa Espacial Chinês ao mercado. O revisionismo ava então, oficialmente, a usar dos grandes desenvolvimentos do socialismo para fomentar seu programa espacial capitalista.
Em 1985 foi anunciado o programa de lançamento de foguetes para clientes comerciais estrangeiros. Esses serviços eram fornecidos pela China Great Wall Industry Corporation. O Programa Espacial Chinês já não estaria mais a serviço do seu povo, mas sim operando sob a égide do mercado. Daí para a frente, a China avança na pugna com o imperialismo ianque e, sobretudo no século XXI, desponta como preocupação aos ianques. No âmbito espacial, lançam a primeira missão lunar em 2007 e realizam outras cinco até 2020.
Corrida interimperialista 385s58
Hoje, o programa é mais uma das frentes da disputa interimperialista entre o Estados Unidos e a China. Desde os idos de 2010, o EUA considera a China uma de suas preocupações centrais no mundo, focando na Ásia suas manobras militares e políticas imperialistas para conter o avanço do social-imperialismo chinês.
São várias as expressões disso. O Acordo de Segurança de Aukus estabeleceu uma tríplice aliança entre o EUA, Reino Unido e Austrália. O EUA realizou nos últimos anos manobras militares de tamanho recorde na Filipinas. Por meio de instrumentos como o Diálogo de Segurança Quadrilateral (Quad), os ianques aproximam as relações com países asiáticos e estabelecem projetos como o Panorama Econômico do Indo-Pacífico (Indo-Pacific Economic Framework, IPEF).
A tecnologia é sempre um tema central. Foi assim na última reunião do Quad e na aprovação da “Lei da Ciência e CHIPS” entre EUA e Taiwan. A lei é uma tentativa do EUA de aumentar a disputa da China na área de semicondutores; a China anunciou nos últimos anos a capacidade de fabricar chips semicondutores de sete nanômetros.
Na corrida espacial, tanto a China quanto o EUA violam os acordos internacionais que não permitem apropriação de recursos na Lua. Os social-imperialistas chineses falam da criação de uma zona econômica Terra-Lua visando a comercialização do espaço e de seus recursos. Já o USA ite que pretende começar a exploração de minérios em solo lunar até 2032 por meio de parcerias com empresas privadas para a comercialização desses recursos. A ideia é também fazer da Lua um entreposto para futuras missões para Marte.
Longe de ser uma prova de desenvolvimento científico nacional e popular, como foi na China socialista, as novas ostentações galácticas do social-imperialismo chinês, que se aproveitam de todo o desenvolvimento conquistado pelo socialismo, são uma extensão da pugna entre potências e superpotências imperialistas.
Nessa disputa, as pugnas entre a superpotência ianque e a potência chinesa aumentaram. Em 2011, a Nasa ou a ser proibida por lei de colaborar com a China e o Congresso ianque barrou os astronautas chineses – os taikonautas – de entrarem na Estação Espacial Internacional. A Nasa também acusa a China de priorizar questões militares. “O programa espacial deles é basicamente militar”, disse o presidente da agência ao jornal monopolista Folha de São Paulo, antes de itir que “a corrida espacial agora é com a China”.