Na madrugada de 2 de abril, cerca de 300 camponeses ocuparam o latifúndio conhecido como fazenda Mata Verde, localizado no município de Guaratinga, no extremo sul da Bahia. Os camponeses denunciam a crise sem precedentes que assola as massas populares no campo e na cidade e apontam as tomadas de terras como saída da condição de miséria. A ocupação faz parte do Abril Vermelho. 5q511e
Porque as famílias ocupam?
As famílias denunciam que a área ocupada é improdutiva e não cumpre a função social da terra. Os camponeses denunciam também a grave crise econômica e o desemprego que assolam o país afirmando que as tomadas de terra são a solução para o problema da fome no Brasil.
A recente ocupação ocorrida em Guaratinga é parte do Abril Vermelho, uma jornada de luta pela terra organizada pelo Movimento Sem Terra (MST) que acontece durante este mês em memória do massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 1996.
Mais de 600 pessoas desabrigadas, este foi o recente cenário formado pela tragédia anunciada que acometeu diversos municípios ao sul da Bahia, incluindo Guaratinga. De acordo com a denúncia feita pelo AND em dezembro de 2021, os governos estaduais e municipais do estado da Bahia não se anteciparam no sentido de mitigar as consequências das fortes chuvas para a população criando um cenário criminoso.
“Nem mesmo três alertas emitidos desde o dia 20 de dezembro por órgãos meteorológicos, como o Centro Nacional de Monitoramento de Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), foram suficientes para que o governador e os prefeitos fizessem planos concretos sobre o que fazer ao desabar das fortes chuvas”.
No final do mês de março ainda havia na cidade pontes e estradas destruídas, postos de saúde e escolas sem funcionar. Algumas comunidades seguem isoladas. Mais de 60 casas caíram e a prefeitura afirma que não há previsão de reconstruí-las.
As massas são empurradas às tomadas de terra
O estado da Bahia, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou no último trimestre de 2021 a segunda maior taxa de desemprego do país, um número subestimado, pois apenas contabilizam apenas a chamada desocupação, caracterizada por pessoas que neste período não trabalharam e procuraram trabalho. As massas em busca de trabalho não adentram esta categoria.
O cenário é ainda mais calamitoso se somado aos dados apresentados no estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pessan), onde é apontado que 116,8 milhões de pessoas no país sofrem de algum tipo de insegurança alimentar. As regiões com os mais altos índices de famélicos são Norte e Nordeste, onde também vem acontecendo uma série de tomadas e retomadas.
Apenas na Bahia, desde o mês de março mais de 3 mil camponeses ocuparam terras do latifúndio. Conforme noticiado por AND, em 25 de março 250 famílias ocuparam o latifúndio conhecido como fazenda Dois Rios, em Itaetê, na região da Chapada Diamantina. No município de Planaltino, cerca de 230 famílias ocuparam terras do latifúndio supostamente pertencentes à Companhia de Ferro Ligas da Bahia (Ferbasa). Em Piritiba, 50 famílias ocuparam o latifúndio fazenda Cajazeira.
Os camponeses de Guaratinga somam-se aos quase 13 mil trabalhadores brasileiros que apenas nos quatro primeiros meses deste ano percorreram o caminho das ocupações de latifúndios a fim de garantir a sobrevivência diante do agravamento da situação de miséria, carestia de alimentos e aumento do índice de desemprego que acometem as massas populares devido à aguda crise do capitalismo burocrático.
A concentração de terras nas mãos do latifúndio
Conforme apontado na pesquisa “Estrutura fundiária nos territórios de identidade da Bahia”¹, o número de estabelecimentos agrícolas com uma área igual ou maior que 500 hectares (ou seja, 500 estádios de futebol) levantados em pelo Censo de 2006 no estado da Bahia, equivale a 46% do território. Esse contingente de terras com cerca de 13,2 milhões de hectares está nas mãos de 1% dos proprietários rurais do estado, os latifundiários.
Ainda no estado, ¼ da produção agrícola corresponde à economia camponesa (agricultura familiar), mesmo com um número ínfimo de terras e quase sem financiamento ou outras assistências do velho Estado.
O embate colocado pelos camponeses da Bahia é parte e reflexo do desenvolvimento da questão central da situação nacional, onde a existência da grande propriedade latifundiária capitalista, se apoia na existência da economia camponesa e na exploração das massas desapropriadas e a resolução desta questão pera a luta pelo justo direito à terra.
Notas:
* SANTOS, José Adriano da Conceição; GOMES, Andréa da Silva; BRAGA, Suely Conceição; PIRES, Mônica de Moura . Estrutura fundiária nos territórios de identidade da Bahia.In: Semana do Economista, IV., 2014, Ilhéus.
Centenas de famílias adentram o latifúndio em Guaratinga, extremo sul da Bahia. Foto: MST
Centenas de famílias adentram o latifúndio em Guaratinga, extremo sul da Bahia. Foto: MST