Nota da redação: Recebemos essa nota da Liga dos Camponeses Pobres do Nordeste e estamos republicando ela na integra. 312b5
No dia 10 de maio em Maceió, Luis Inácio (PT), sabujo profissional a serviço do latifúndio, reuniu-se em palanque com representantes das duas principais oligarquias latifundiárias históricas de alagoas para entregar apartamentos do “Minha Casa, Minha Vida”. Entre outros escroques, estiveram presentes: o governador do estado Paulo Dantas – do MDB de Renan Calheiros e posto no cargo como sucessor de seu filho, hoje ministro de Lula e também presente no evento; e o “príncipe” da direita latifundista no país, o presidente do Congresso Nacional Arthur Lira (PP) – o presidente de fato do país, conforme tem analisado AND. Para completar o disparate, também figurou em destaque o prefeito de Maceió JHC, do mesmo PL de Bolsonaro.
Historicamente, e ainda hoje, as duas famílias – os Lira e os Calheiros – compõem o quadro das oligarquias mais influentes no estado, grandes proprietários de terras, muitas das quais griladas e tomadas a força dos camponeses, que controlam a política oficial no estado como senhores feudais a dividir entre si a influência não só nas prefeituras municipais, mas em todas as instituições públicas. A título de exemplo, enquanto os Calheiros controlam o executivo estadual já há algumas décadas, é fato notório em Alagoas que o Poder Judiciário do estado está sob influência direta dos Lira. Àqueles que não reconhecem a vigência da semifeudalidade no Brasil, basta tomarem depoimento de qualquer família camponesa do estado sobre a atuação destas (e outras) famílias, como um verdadeiro testemunho da permanência das mais atrasadas relações político-sociais sobre a base econômica da existência continuada do latifúndio alagoano.
No evento, não bastassem os abraços e bajulação entre “adversários” típicos da politicagem nacional, ainda mais em ano de eleições municipais, não foi outro senão o próprio oportunista-chefe Luis Inácio a sair em defesa de Arthur Lira e seus cumpinchas, diante das recorrentes vaias da plateia presente. Após desfilar engodos sobre “não aceitar a miséria” em que o povo vive no país que ele mesmo governa, e ar um sermão sobre “não vaiar a visita na nossa casa”, Lula elogiou e defendeu Lira, afirmando que a entrega daquelas casas bem como as outras realizações (?!) do governo só tem sido possíveis pelo apoio que tem recebido no congresso onde, segundo afirma, “o governo não sofreu nenhuma derrota” e todos os seus projetos têm sido aprovados. Restando ainda encontrar alguém inocente o bastante para acreditar em tamanha lorota.
Já o presidente do Câmara dos Deputados, que no dia anterior havia derrubado veto da presidência, arrancando do orçamento federal mais 3,6 bilhões de reais para a farra das emendas parlamentares, sentiu-se ofendido com as vaias e esbravejou em defesa do seu próprio pai, oligarca e latifundiário de carreira, ex-senador e hoje prefeito de município alagoano, e segundo Lira, o verdadeiro responsável pela entrega daquelas casas.
Embora as direções oportunistas de alguns movimentos eleitoreiros no estado, em especial os de luta pela terra, houvessem raspado o tacho do que ainda resta de massas iludidas com o gerente de turno, mobilizando esvaziadas caravanas à capital do estado para esmolar atenção dos poderosos ali presentes, seus apelos foram largamente ignorados, não tendo Luis Inácio sequer renovado as falsas e vazias promessas de reforma agrária com uma suposta “prateleira de terras”.
ACORDOS INDECOROSOS E INTERESSES ESPÚRIOS
Já no âmbito alagoano, à guisa dos conchavos típicos da escumalha da política oficial, grandes acordões têm se processado a portas fechadas, à revelia das leis e em detrimento de milhares de camponeses pobres, sem terra ou com pouca terra, incluindo os posseiros que vivem e produzem em seus sítios há décadas. Entre os personagens funestos deste enredo trágico vemos o governo oportunista de Luis Inácio, o latifundista Arthur Lira, a extrema-direita sanguinária e bravo campesinato alagoano.
Se num primeiro momento, à silenciosa voz de comando de Arthur Lira, cogitou-se um natimorto despejo nas terras da falida Usina Laginha, município de União dos Palmares, onde há mais de 10 anos cerca de 3 mil famílias de camponeses sem terra acampam, sob as bandeiras das mais variadas organizações, a espera da desapropriação para reforma agrária prometida pelo INCRA durante os governos do oportunismo e pelo atual Ministro de Lula, Renan Calheiros Filho, quando era governador do estado. Fracassado talvez menos pela capacidade de articulação e negociação das direções dos movimentos já viciados nesse velho jogo da politicalha eleitoreira e antipovo, e talvez mais pela apreensão e medo que gera nos guardiões desta velha ordem a certeza deste resultar num grande levantamento camponês, desbordando os limites estreitos da “luta legal” no regime democrático vigente.
No episódio mais recente, dos 17 desembargadores de alagoas, 13 se declararam impedidos ou “suspeitos” para julgar o processo bilionário de falência da Usina Laginha, tendo o desembargador Carlos Cavalcanti encaminhado o caso para que fosse julgado no STF, uma vez que entre os desembargadores do Tribunal de Justiça de Alagoas há desde “amigos pessoais” do donos e advogados da Laginha, até o caso de um desembargado cujo filho já trabalhou diretamente como advogado da usina falida. Resta esclarecer o caso, pouco crível diga-se, onde reúne-se num mesmo tribunal tantos amigos de um latifundiário em particular (da Laginha), mas que não possuem qualquer relação “suspeita” ou impeditiva para julgar o restante das usinas e latifúndios do estado.
Enquanto isso, os porta-vozes do governo em meio às direções pelegas dos movimentos há meses repetem que “a Laginha já está ganha” e que falta apenas concluir o acordo para dividir as terras para o povo, enquanto negociam com órgãos oficiais a melhor forma de encher as burras, caso a desapropriação venha acontecer de fato.
A posterior, o obstinado Lira manejou nova empreitada inglória: despejar a segunda maior área de conflito agrário no estado (sendo a primeira o caso da Laginha), onde residem e trabalham mais de 700 famílias (cerca de 2.500 pessoas) de camponeses pobres em 5 comunidades diferentes, abrangendo território dos municípios de Rio Largo, Messias e Flexeiras, acossados há anos pelos pretensos “donos” dessas terras, os proprietários da Usina Utinga Leão. Mesmo havendo decisão da então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, decretando o encerramento do processo movido há décadas pela usina contra os camponeses por esta não conseguir comprovar a alegação de propriedade das terras.
Soube-se, por fim, da mais indecorosa das propostas: remover pela força as famílias de posseiros de suas casas construídas e suas lavouras produtivas, sob ordens do Juiz Agrário e com o apoio do governo do estado, e transferi-las para dentro dos acampamentos da Usina Laginha, a mais de 40 quilômetros de distância para morarem em barracos de lona à espera (eterna) da reforma agrária de Luis Inácio! Este concerto de reacionários pretendia realizar-se com a cooperação ativa de dirigentes de movimentos que advocariam “causa perdida” na Utinga para convencer os camponeses a sair das terras.
A resposta das massas não demorou a chegar: vide o protesto combativo dos camponeses da Liga dos Camponeses Pobres na quarta (15) bloqueando por mais de 3 horas a BR-104 com pneus em chamas, prenunciando o tom da resistência a qualquer tentativa de cumprir este despejo ilegal.
A SANHA DA EXTREMA DIREITA
Enquanto isso, a extrema direita avança no congresso, com as bençãos de Arthur Lira, o famigerado “PL Invasão Zero”, que pretende legalizar a atuação de grupos paramilitares armados pelo latifúndio para combater a luta pela terra no país, realizando “reintegrações de posse” sem a necessidade de presença da polícia, sem ordem judicial para tal nem muito menos comprovar a propriedade da terra. Aprovado este projeto, se intensificarão sob as vestes de legalidade os crimes correntes do latifúndio contra os camponeses, como os assassinatos das lideranças camponesas Mãe Bernadete e Nega Pataxó, ambos na Bahia, bem como outros ataques armados que já acontecem em escala cada vez maior país afora.
Ao atacar os camponeses pobres e conseguir que se realize grande operação de despejo no próprio estado, o latifundiário Arthur Lira busca “mostrar serviço” para cair ainda mais nas graças da extrema-direita a nível nacional (de quem foi muito amigo durante o governo militar genocida de Bolsonaro) com quem espera contar para emplacar escolhido seu para a substituí-lo no posto de presidente da Câmara Federal no próximo ano, cargo decisivo para controlar os bilhões de reais em emendas e a influência decisiva no Legislativo e Executivo do país, bem como preparar terreno para lucrar com o próximo pleito presidencial.
Já o governo do oportunismo, completamente inerte para atender às demandas de dar terra para quem nela vive e trabalha, necessita pelo menos manter a reforma agrária como uma possibilidade em aberto para seguir enganando os raros incautos, isto é, “ainda não fiz mas vou fazer assim que puder”. Dessa maneira, mantém sob as rédeas da corporativização a maior parte dos movimentos no campo, cooptados pela política suboficial de quem “criticar o governo e fizer luta combativa, não ganhará terra”, além do devaneio eleitoreiro de que “criticar o governo agora só ajuda a extrema-direita”. Assim, o governo acena com a desapropriação da Laginha para dar às direções oportunistas de movimentos no campo condições mínimas de cumprir a tarefa cada dia mais difícil de conter o ímpeto combativo do campesinato para que este não coloque em campo todas as suas forças para conquistar a tão desejada terra e atrapalhe os acordos do governo federal com o Congresso, leia-se os afagos de Luis Inácio em Arthur Lira em nome da governabilidade.
Ainda na minúscula eventualidade de, em meio à grave crise política-econômica-social e militar por que a o governo, conseguirem as partes consertarem entre si um acordo e ainda empurrá-lo goela abaixo ao povo, restaria ainda ao latifúndio a benesse governamental de, a título de adjudicação das terras – instrumento por meio do qual o governo confisca certa propriedade como pagamento de dívidas, por exemplo –, receberem indenizações avultantes e longas cartas de crédito que jamais serão pagas, como é de praxe o não pagamento quando o governo “empresta” dinheiro aos grandes latifundiários. Comprovando mais uma vez o papel da Reforma Agrária do governo (quando esta acontece) como fundo de capitalização do latifúndio, permitindo, por exemplo, renovar as aspirações oligárquicas daqueles que lucraram bilhões com a Usina Laginha e depois a “faliram” para não ter que pagar as dívidas com o governo, entre impostos e empréstimos, e muito menos as dívidas trabalhistas com as massas que sustentaram a suor e sangue a ganância latifundista da cana-de-açúcar.
Resta portanto, àqueles que não veem nestas sujas negociatas a defesa dos seus interesses nem a possibilidade de conquista real da terra para trabalhar e viver, a luta combativa e a Revolução Agrária como único caminho consequente que pode dar terra ao povo do campo e defender a sua posse pelos camponeses pobres e médios.
Liga dos Camponeses Pobres Nordeste
L-NE